Perguntas sobre a nova operação no BES

0 Posted by - August 3, 2014 - Blog

Não sei se entendi bem o que o político e comentador Marques Mendes, anunciou ontem em relação à operação em curso no BES. Aquilo que me pareceu óbvio é que vão ser injectados capitais – incluindo públicos – para o objectivo final de vender os bons activos do BES à banca internacional (Deutsche Bank?) que vai adquirir – de uma vez – 20% do mercado nacional e tornar-se um elemento essencial no mercado português. Ou seja, aquilo que nunca tinha conseguido antes, mesmo com as suas participações de capital noutras instituições.

Mas deixem-me fazer algumas perguntas:

* Há a possibilidade de o fundo de capitalização (de fundos públicos, emprestados pela troika e, por isso, pagos como dívida pública) que vai recapitalizar o Good BES não reaver os capitais injectados no BES, após a sua venda? Que garantias há que o preço de venda cubra o capital injectado?

* Além desses, é dito que não são fundos públicos que entrarão na recapitalização do Good BES, mas do Fundo de Resolução. Ora, esse Fundo é – de acordo com o novo Regime Geral de Instituições de Crédito (DL 31-A/2012) – composto pelas instituições de crédito com sede em Portugal. Ou seja, incluindo a CGD. E são essas instituições que financiam o fundo. Questão: qual é a parte da CGD nesse fundo actualmente?

* Mais: esse mesmo diploma fixa que “Se os recursos do Fundo se mostrarem insuficientes para o cumprimento das suas obrigações, pode ser determinado por diploma próprio que as instituições participantes efectuem contribuições especiais, e definir os montantes, prestações, prazos e demais termos dessas contribuições” e que (artigo 153-J) “aos recursos previstos no artigo anterior poderão ainda acrescer, excepcionalmente, contribuições adicionais do Estado para o Fundo, nomeadamente sob a forma de empréstimos ou prestação de garantias”. Portanto, não é verdade que seja o sector financeiro privado que vai financiar o novo banco. Os recursos públicos estarão lá metidos também. E em grande parte.

* Diz o novo diploma que se fará uma selecção de activos entre o Good BES e o Bad BES. Mas como se vai fazer a avaliação e a selecção dos activos? Pelas mesmas firmas de auditoria que deixaram passar a a actual situação e que agora afirmam que não têm poderes para obrigar a instituição auditada a fornecer informação? Quem pagará esse trabalho? É que o novo Regime Geral de Instituições de Crédito apenas diz que é o Banco de Portugal a determinar que parte do activo seja transferido, mas não esclerece como.

* A questão anterior não é de somenos, já que o mesmo Regime Geral fixa que: “Caso a contrapartida fixada no momento da alienação dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão transferidos não corresponda comprovadamente ao seu justo valor, pode a instituição adquirente, após autorização do Banco de Portugal, devolver esses activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão”. Ou que “Em alternativa à devolução prevista no número anterior, pode o Banco de Portugal propor à instituição adquirente o pagamento do valor correspondente à diferença existente entre a contrapartida estipulada para a alienação e o justo valor dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão”.  E que “O pagamento previsto no número anterior pode ser efectuado através da transferência para a instituição adquirente de novos activos da instituição de crédito alienante ou de verbas provenientes do Fundo de Resolução, do Fundo de Garantia de Depósitos”. Ou seja, que garantias há – garantias mesmo! – que não sejamos postos a pagar uma reavaliação dos activos?

* E o que acontece ao Bad BES? Supostamente os accionistas actuais vão arcar com as responsabilidades surgidas. E se não conseguirem solver os seus encargos, o que acontece ao Bad BES? Entra em insolvência? Ou será que os bens pessoais dos administradores e beneficiários dá gestão danosa vão ser chamados a pagar? Ou a responsabilidade é limitada ao Bad BES e nesse caso as contas offshore da família Espírito Santo – eventualmente alimentadas com os últimos empréstimos do BES, feitos à pressa antes que o Banco de Portugal actuasse – continuarão activas e a gozar o bom da vida com o dinheiro dos seus clientes? Que medidas vão ser tomadas para que os seus bens pessoais sejam chamados a pagar o “buraco”?

Portanto, há ainda muitos pormenores a estudar e a dar atenção.

É que, como diz o ditado alemão, “é nos pormenores que se esconde o diabo”…